
Recentemente, visitei a exposição “Carolina Maria de Jesus: Um Brasil para os brasileiros”, no Museu de Arte do Rio de Janeiro, com curadoria de Hélio Menezes e Raquel Barreto.
Nos arredores do museu, tanto no lado de fora quanto no de dentro, há imagens gigantes da Carolina, e esse fato logo me fez pensar: quantas mulheres com a cor e com traços como os de Carolina estão sendo celebradas em museus e outros espaços artísticos? É importante enfatizar que a primeira imagem da escritora, maximizada em uma parede, a apresenta de cabelos soltos, com brincos, roupa e adereços de festa, ou seja, o início perfeito de uma celebração.
Então, seguindo para o primeiro andar do museu, encontramos, nos corredores e nas paredes ao lado das escadas, diversas frases da poetisa negra. Uma delas é: “O mundo modifica para os que reagem”. Essa frase representa muito bem quem é Carolina: uma mulher que experimentou o sabor da pobreza extrema e que, por meio da escrita, alterou, transformou e modificou o seu mundo.
A exposição engrandece todo o legado político, literário e cultural que Carolina nos deixou, apresentando como a sua obra foi revisitada nos últimos 30 anos e as homenagens que ela tem recebido. Carolina pode ser vista como a representação de diversas lutas – pela moradia, pela educação, pela cidadania e pela igualdade, racial e de gênero.

A obra de um escritor nos permite entender um pouco de sua personalidade, seus desejos, sua visão de mundo, e com a Carolina isso não é diferente: é quase possível tocar toda a força, estima e segurança que a poetisa acumulou em sua trajetória. E, nesse contexto de revisitação, diversas imagens de Carolina, algumas bem conhecidas, passaram por uma intervenção artística – a colagem – , gerando um tom ainda mais alegre para a captura de sorrisos em preto e branco. Algumas das obras presentes na exposição pertencem à coleção “Te imagino, Carolina”, da artista maranhense Silvana Mendes.
Além disso, se o clima é de celebração, não poderia faltar a música; e Carolina é a dona da voz que ecoa em músicas pelos salões. A que estava tocando, no momento em que eu visitei a exposição, era “Vedete da Favela”, e os versos do refrão
“Salve ela
Salve ela
A vedete da favela”
expressam, resumem e, de alguma forma, até mesmo homenageiam essa grande artista.
Para mais, em diversos momentos, a história brasileira assumiu o papel de descrever Carolina Maria de Jesus unicamente como favelada ou miserável; e essa exposição combate fortemente essa narrativa, apresentando várias situações de glória da autora. A própria curadoria expressou, por meio de um texto presente na apresentação da exposição, que a maioria das imagens conhecidas da artista retratam a escritora de maneira triste, cabisbaixa e até melancólica. Mas Carolina escreveu:
”… eu adoro minha pele negra, e o meu cabelo rústico …”

Ademais, Carolina não pode ser resumida a esses momentos infelizes: sua vaidade, seu cabelo, sua elegância, sua pluralidade precisam ser evidenciadas. A fotografia em que ela aparece ao lado de um avião, rumo à França, é um dos exemplos disso; assim como a fotografia em que Carolina aparece no clube Renascença, local muito badalado na década de 1960. A exposição também conta com algumas roupas e adereços produzidos por Carolina, demonstrando sua dedicação, disposição e talento para o carnaval: penas, flores e pérolas marcam presença.
Embora nas paredes do Museu de Arte do Rio haja a reprodução de uma página de jornal que tinha como manchete a morte da escritora, em 1977, a exposição não se encerra com essa notícia. A exposição evidencia como diversas escritoras nacionais e internacionais se inspiram na exuberante obra da Carolina, eternizando o seu legado. Vale ainda mencionar que diversos prêmios que levam o nome da escritora foram criados, como o lançado pelo Ministério da Cultura em 2023.
Não deixem de visitar essa exposição, tão completa, que celebra a vida e a obra de Carolina Maria de Jesus.

Ual! Que beleza de texto e de exposição. Uma sensibilidade e um olhar necessários para mostrar a mulher que escreveu “Quarto de despejo”, mas não só.
CurtirCurtir