“Negra só fica bonita de cabelo trançado ou liso”?

20200123_215906Desde muito pequena, eu nunca entendi muito bem o padrão de beleza, e por que eu, negra, não me encaixava em tal padrão de mulheres… brancas. Hoje, eu entendo: eu não sou branca, sou uma mulher negra. Eu cresci vendo princesas brancas, com cabelos lisos e geralmente com olhos claros, e ficava me perguntando: meu Deus, será que eu não posso ser uma princesa ?

Pra mim, minha cor era horrível; era assim que eu me sentia, e de toda forma eu tentava ser aceita socialmente: alisei meu cabelo, como quase toda menina negra faz – eu odiava passar a “chapinha”. Minha mãe sempre colocou aqueles “miojinhos” no meu cabelo, também faziam bastante tranças nagô… “negra só fica bonita de cabelo trançado ou liso”? Era o que eu pensava. E, mesmo que eu mudasse meu cabelo, eu ainda não era aceita, e por quê? Eu ainda não conseguia entender.

Eu cresci e comecei a perceber que o problema não era eu, nem meu cabelo crespo, muito menos minha cor negra, e sim as pessoas preconceituosas que viviam à minha volta. No ensino médio, comecei a entender e aprender mais sobre as origens deste preconceito, nas aulas de Sociologia e Filosofia. Nessas aulas, conversávamos sobre o branqueamento racial, uma ideologia que também foi aceita no Brasil como solução para diminuir a quantidade de negros; eu fiquei realmente chocada com aquilo. Estudei também sobre o Apartheid, que foi um regime de segregação implementado na África do Sul, e sobre o Darwinismo social. Essas aulas mudaram muito minha perspectiva sobre minha cor: pela primeira vez, me olhei e vi que eu não era o problema. Eu também fui apresentada à Carolina Maria de Jesus, uma escritora negra e brasileira, e me senti tão feliz: aquilo era uma representatividade e tanto! Eu sempre gostei de ler, quando soube de uma escritora negra, me senti como se eu pudesse ser qualquer coisa, até mesmo ser uma escritora como ela.

Mas, ainda sim, no Ensino Médio, época da minha transição, eu ainda não me sentia confortável com o meu cabelo crespo e pequeno. Coloquei as tranças box braid. E me senti na moda, era o que todas usavam, era a moda negra do momento. “Se você quiser ficar bonita aos olhos da sociedade, coloque tranças.” Ou era isso, ou você tinha que ter cabelos cacheados; o crespo tipo 4, seja ele a, b ou c, não eram bonitos. Bem, meu cabelo cresceu, e ficou bem grande, mas já recebi ofensas disfarçadas de elogios – de pessoas da minha família! E eram do tipo: “Devia passar uma guanidina para abaixar essa juba, ficaria com o cabelo mais comportado.”

Por que eu devia controlar meu cabelo?

Eu ainda não entendia o porquê de tanto preconceito. Hoje, na época em que estamos, todos os tipos são aceitos, e as meninas se sentem representadas, até eu mesma. Porém, mesmo com esse avanço, ainda existem pessoas para humilhar e dizer que o seu cabelo “não é bom.” Enfim, hoje tenho uma relação de amor com meu cabelo, me sinto bem com ele e a opinião de ninguém vai me fazer mudar a sua forma. Coloquei em minha cabeça que as curvaturas do meu cabelo 4b são perfeitas.

Hoje em dia, talvez as crianças negras se sintam mais representadas, porém ainda não nos 100%. Existe uma princesa negra e um príncipe negro também em A princesa e o Sapo, da Disney, por exemplo; super heróis negros, como o Pantera Negra, ou a Tempestade, dos X-Men, ambos da Marvel; ou o pequeno Dion da série que tem a maioria de seu elenco principal negro, da Netflix, Criando Dion (Raising Dion).

Hoje, eu entendo que o problema nunca foi minha cor, meu cabelo ou qualquer outra coisa em mim. Sou linda do jeito que sou; não preciso de um padrão para seguir.

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