Thaíse Santana. Mulher-Palavra. Editora Patuá, 2021.

Nascida em São Pedro, periferia de Itabuna, no sul da Bahia, Thaíse Santana é licenciada em Letras (UESC), mestra em Letras (UFV) e doutoranda em Literaturas (UFF). Pesquisadora do GPAfro (UESC/CNPq), em que estuda literaturas de mulheres negras, mora em Sabará, região metropolitana de Belo Horizonte. É professora da rede estadual, atuando na Educação Básica e na Educação de Jovens e Adultos.
Como escritora, Thaíse já participou de algumas antologias literárias, destacando-se os Cadernos Negros 43; além disso, integra os coletivos “Baobá Sabará”, “Preta das Letras” e “Mulherio das Letras”. No instagram, Thaíse divulga textos literários no perfil @literaturademulhernegra e, em seu perfil pessoal, compartilha alguns fragmentos de sua vida-escrita.
MULHER-PALAVRA
Te leio
me reconheço
entre um verso e outro
um silêncio profundo
a palavra pulsa
escrevo
e na contramão do mundo
me alimento de versos
e sonhos.
Em seu livro de estreia, Mulher-Palavra, constituído por 39 poemas, Thaíse Santana reúne poemas produzidos ao longo de 10 anos, no período de 2011 a 2021, divididos em três momentos: “sentir”, “sangrar” e “resistir”. Os textos expressam os sentimentos da autora, desde a infância catando cacau pelos quintais da vida; expressam ainda as dores – das perdas, do racismo – e a resistência da voz poética da mulher negra.
A obra é de uma delicadeza tocante, ao mesmo tempo que nos permite perceber a força da autora que atravessou tantas situações ao longo da vida. No final do livro, Thaíse expõe seu sentimento em relação ao processo de escrita e lançamento de seu primeiro trabalho: “Por muito tempo acolhi o silêncio imposto. O silêncio que calava a Palavra. Há anos vinha escrevendo e guardando. Escrevendo e sangrando. Mulher-Palavra é um sonho antigo tecido no silêncio. Hoje silêncio é linguagem e não mais silenciamento. A minha palavra está liberta para encontrar outras moradas. Visitar outras gentes e alimentar outros sonhos. Mulher-Palavra existe porque negras mulheres alimentaram as minhas bases de coragem. Mulheres iguais a mim, na raça e no desejo de construir outras possibilidades de existência. Minha Palavra é o meu amuleto. Dela faço brotar poesia e também resistência.”.
PARTO
A poesia nasce de mim
das minhas entranhas
das minhas dores
num grito aberto
faço existir
um corpo-verbo
uma palavra-sonho
que se lança
e alcança o mundo
escrever é parir
Eu vi muita força nessa declaração. Ao longo da nossa jornada, somos constantemente silenciadas e desencorajadas a nos impor em determinados ambientes; mas, à medida que nos conhecemos, reconhecemos nossas semelhantes e nos apropriamos da nossa história, somos encorajadas e nos sentimos confiantes para nos abrirmos para o mundo e compartilharmos nossas experiências, nossas vivências, desejos e conhecimentos. E, a partir disso, nossa narrativa inspira, incentiva e liberta outras mulheres. À medida que eu ia avançando na leitura dos poemas, senti que me aproximava de Thaíse. Por se tratar de textos tão íntimos, que relatam experiências, dores e amores, eu tinha a sensação de que ela conversava comigo, relatando suas emoções como quem as compartilha com uma amiga muito querida, de uma maneira muito poética e cativante.
A leitura foi uma experiência prazerosa, de reconhecimento, e despertou um sentimento de cumplicidade. Ah, e vale destacar que o livro é lindo! Não falo apenas da obra da Thaíse, mas da capa e do projeto gráfico – de uma beleza que, na minha opinião, completam muito a experiência de leitura. E, para encerrar, deixo vocês com este belíssimo poema:
RODA ANCESTRAL
Eu sou um corpo
de alma
parida na África
eu sou memória
de gente
perdida na diáspora
eu sou história
girando a roda dos meus
ancestrais.
Que alegria ler a sua resenha, Patrícia. E fico feliz que meu livro tenha te causado identificação. Muito obrigada pela sua leitura e escrita ❤
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